maio 26, 2012

Os interesses corporativos, o AO90 e a falta de “engenho e arte”


Num país tradicionalmente conservador, clientelar e corporativo, sempre que há mudanças no sentido do alargamento e da quebra de barreiras os mais incompetentes e instalados queixam-se, vociferam e exigem a reposição das proteções corporativas, mesmo que as proteções corporativas não tenham sido realmente afetadas. Os maus profissionais têm sempre medo da mudança, mesmo que não tenham razões para a temer, mas a consciência das incompetências e insuficiências próprias fala mais alto.

No caso do AO, os maus tradutores e os maus editores andam em pânico. A partir daqui, basta puxar pela ignorância, pela xenofobia e pela tamanquice (que nenhuma delas escasseia em Portugal) e sempre se obterá ressonância para nulidades contra o AO.

Vem isto a propósito deste artigo. Nele, José Jorge Letria (presidente da SPA) queixa-se que a SPA não foi ouvida sobre o AO e José Manuel Mendes (presidente da APE) queixa-se de “uma perigosa deriva da língua” originada pelo AO. O primeiro esquece que se não foi com o apoio de entidades corporativas que se decretou em 1911 a ortografia etimológica simplificada que todos os escritores hoje usam e não contestam, quer tenham adotado o AO ou não, assim como esquece que nunca um projeto legislativo foi discutido e debatido por tantos anos em Portugal como o AO foi.. O segundo esquece que a “deriva da língua” é algo natural em idiomas vivos, e que os autores são eles próprios protagonistas nas derivas linguísticas.

Estes dois tiros ao lado contra o AO têm, como outros, origem em interesses corporativos mais preocupados com perdas imaginadas do que em potenciar o tanto que autores e escritores podem retirar do AO. A todos falta “engenho e arte”.

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